Espiritualidade prática, com Debora Pivotto

Espiritualidade e autoconhecimento conectados com a nossa saúde física e mental, com o coletivo e com a vida prática
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Terapia é para transformar – e não para domesticar

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Por Debora Pivotto
Atualizado em 26 jan 2023, 19h59 - Publicado em 26 jan 2023, 19h52

Acompanhei atenta na semana passada a repercussão na mídia do lançamento da música “Bzrp Music Sessions, Vol. 53”, hit da colombiana Shakira, em que ela joga no ventilador toda a sua verdade sobre a traição do ex-marido e seus sentimentos.

Particularmente, achei a música incrível e muito positiva toda essa repercussão. Acho que gerar reflexões a partir de sua obra – direta ou indiretamente – é parte importante do trabalho de qualquer artista. Mas me chamou a atenção um “argumento” que foi muito usado entre os que criticavam a atitude da cantora: “Shakira precisa de terapia”. Será mesmo?

Fiquei impressionada como muita gente acha que colocar a raiva pra fora e expor as canalhices de um ex é se humilhar ou se rebaixar. Vivemos uma época estranha em que as pessoas se permitem expor apenas aquilo que é belo, leve ou que já foi totalmente superado. E dentro dessa lógica romântica e artificial de vida, as pessoas veem a terapia como um dos únicos espaços privados e seguros em que é permitido expressar sentimentos que não queremos expor, como raiva, ranço e vontade de se vingar. É tipo assim, primeiro você “se cura” na terapia, depois você se abre para o mundo.

E a pergunta surge a partir disso é: o que esperamos da terapia? Transformação ou domesticação?

A terapia de fato é um espaço muito íntimo em que as pessoas são livres para falar sobre suas dores, seus desejos mais profundos e o que mais elas quiserem. E a partir dessas confissões e de uma escuta cuidadosa, cada um pode elaborar melhor aquilo que dói e ter importantes reflexões sobre seus sentimentos e suas ações. Mas isso não significa pacificar ou domesticar as pessoas. Pelo contrário. Muitas vezes, é falando sobre uma traição na terapia, que a pessoa percebe o quanto se sentiu humilhada, desvalorizada e machucada. E a vontade de gritar esses sentimentos para o mundo é muito legítima, principalmente quando se trata de uma artista/compositora. Aliás, a arte, quando expressa a verdade de nossa essência, é incrivelmente terapêutica!

Um trabalho de autoconhecimento profundo ajuda a criar um campo emocional muito fértil que, ao mesmo tempo em que revela sentimentos escondidos de nós mesmos, cria condições favoráveis para que nossa criatividade genuína possa florescer. Autoconhecimento é pré-condição para liberdade! É o que nos possibilita ser quem realmente queremos ser e não para apaziguar aquilo que é rejeitado pela sociedade e fazer com que a gente se encaixe num padrão de comportamento – que, no caso das mulheres, é aquela máscara de boazinha e fofa.

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O silenciamento de nossa visceral idade é o que o mundo patriarcal espera de todas nós. E a terapia não pode estar a serviço de um sistema que nos amorna e nos coloca em uma caixa. Pelo contrário, ela existe para nos ajudar a ter coragem! Coragem de olhar para nós mesmas e nos permitir sentir tudo o que vibra em nosso coração e em nosso fígado. E, principalmente, ter coragem para expressar a verdade que nos habita: seja amor, paz, raiva ou sede de vingança.

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