“Só me dei conta de quanto eu era apegada ao meu cabelo quando veio a notícia de que eu estava com câncer. O baque nesse momento é tão grande que passa tudo pela cabeça ao mesmo tempo: ‘Vou ficar sem peito, careca e posso morrer!’ O médico me disse que era preciso retirar a mama em que o nódulo apareceu, mas não me deu praticamente nenhum detalhe sobre como minha aparência iria ficar. Perdi o chão.
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Fui diagnosticada com a doença em 2012, quando eu tinha 35 anos, após apalpar um caroço no banho. Apesar de não ter histórico na família, o diagnóstico foi um dos mais agressivos que existem — e que apresentava altíssima mortalidade até então. Foram dez dias chorando sem parar, pesquisando preços de caixão, cerimônias de cremação e com a autoestima completamente destruída. Até que um dia, me olhei no espelho e meu rosto parecia um pão francês de tão inchado. Decidi que era a hora de reagir.
Procurei uma segunda opinião; não era possível que seria assim tão trágico. Um amigo oncologista me indicou uma mastologista que mudou minha vida. Ela viu meus exames e, sim, confirmou o que já sabia. Porém, de uma maneira muito delicada, me explicou que eu removeria as mamas, mas poderia fazer uma cirurgia reconstrutora imediatamente.
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Saí do consultório com outro astral. Em vez de buscar preços em funerárias, fui atrás de perucas e apliques. E olha que nem tinha começado de fato o tratamento! Sabia que uma hora o cabelo ia cair e essa expectativa da queda é tão ruim ou até pior do fato em si, porque você não sabe direito nem como nem quando o problema vai começar.
No meu caso, foi de repente: do nada, o cabelo começou a despencar sobre a comida, saiam chumaços no chuveiro e o travesseiro ficou coberto de mechas. Pensei: ‘Chegou a hora de raspar!’. Mas não fiz a Camila, não [personagem de Carolina Dieckmann, na novela da Globo Laços de Família]. Pelo contrário: chamei dois amigos, abri uma garrafa de vinho para dar coragem e eles me ajudaram. Foi libertador! Tenho tudo gravado e realmente eles me ajudaram a deixar o momento mais leve.
Antes do câncer, meu cabelo era longo, até a cintura, todo cacheado. Passava mil cremes, fazia hidratação, cuidava mais dos fios do que da pele. Mas hoje vejo o quanto esse apego era bobo diante de todos os outros problemas que enfrentei. Foi quando chegou o momento de ir atrás das perucas. Queria uma bem linda, discreta e natural, que pudesse disfarçar minha doença, mas os preços eram exorbitantes. Estava sem emprego, pagando um absurdo no tratamento, era impossível gastar 4 mil reais em um acessório só. Minha mãe me deu 300 reais e, com esse dinheiro, comprei seis versões bem diferentonas – rosa, loira, comprida, chanel. E percebi que seria melhor eu me divertir e me fantasiar em vez de me esconder. Isso ajudava, inclusive, a quebrar o gelo com as outras pessoas.
Como previsto, no começo meu cabelo cresceu um pouco frisado, elétrico, mas aos poucos foi tomando jeito. Até fiz descoloração depois do tratamento. O que foi um erro — aliás, não recomendo para ninguém! Ele ficou muito fraco, quebradiço. Em seguida, sem o descolorante, os fios já estavam bem mais fortes, saudáveis e não tenho trabalho nenhum.
Hoje, quando vou malhar – um hábito que adquiri só depois que fiquei doente – prendo os fios com um rabo, faço tranças ou amarro um lenço, que virou uma espécie de marca registrada. Tanto que sempre tenho um na bolsa”.
No vídeo abaixo, Flávia ensina a fazer amarrações com lenços, conta um pouco mais de sua história de superação e compartilha informações sobre seu livro (Quimioterapia e Beleza, Ed. Jardim dos Livros, R$ 21,90, 236 págs.) e seu projeto Quimioterapia e Beleza.
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